Publicado em: 06/03/2018 12h54 – Atualizado em 09/03/2018 15h57
Cinema e história
Carlos Gustavo Nóbrega de Jesus é superintendente da Fundação Pró-Memória e doutor em História Cultural e Pesquisador da Unicamp/IFCH
A relação entre cinema e história é uma via de mão dupla. Diferentemente do que se possa pensar o leitor mais incauto, não é só o primeiro que se beneficia das diversas possibilidades dadas pelos acontecimentos históricos, mas a disciplina também usa da película para construir seu conhecimento.
Deve-se considerar que a partir dos anos 1970 a historiografia passou a privilegiar, de forma intensa, o uso de diversificados tipos de fontes. De acordo com um novo olhar da História, principiado no começo do século 20, o documento escrito deixou de ser a única matéria prima do historiador. Entre diversas fontes destacam-se as iconográficas, ou seja, as artes plásticas, as fotografias e também o cinema. Mas, diferentemente de momentos anteriores agora a iconografia não serve apenas para ilustrar um livro didático ou uma aula de História, ela deve ser problematizada como documento histórico, ou seja, um instrumento que auxilia a representação de um momento histórico específico, atravessado pela cultura, a política, a economia da época que foi produzido, construído e divulgado.
Assim, é importante registrar que hoje se admite que a imagem não ilustra nem reproduz a realidade, ela a reconstrói a partir de uma linguagem própria que é produzida num dado contexto histórico. Isto quer dizer que a utilização da imagem pelo historiador pressupõe uma série de indagações que vão muito além do reconhecimento do glamour dos documentos visuais. O historiador deverá passar por um processo de educação do olhar que lhe possibilite “ler” as imagens” (KORNIS, 1992, p.238). Isto significa que o filme pode tornar-se um documento para a pesquisa histórica, na medida em que articula ao contexto histórico e social que o produziu um conjunto de elementos intrínsecos à própria expressão cinematográfica. Ao invés de refletir a realidade ele pode ser visto com agente transformador desta realidade.
Desta forma, tratado como documento histórico, o filme requer a formulação de novas técnicas de análise que deem conta de um conjunto de elementos que se interpõem entre a câmera e o evento filmado. (Cf. KORNIS, 1992, p.239).
Assim, as circunstâncias de produção, exibição e recepção envolveriam toda uma gama de variáveis importantes que devem ser consideradas numa análise do filme. O que torna o seu uso na construção do conhecimento histórico uma tarefa trabalhosa e nem por isso menos prazerosa.
(continua)
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